Custeio sindical no Brasil da Perspectiva da OIT

DSC_0500Na 1ᵃ Plenária Regional Sul do Ramo Químico, realizada nos dias 11 e 12 de junho em Curitiba, Paraná, outro grande destaque foi o tema Custeio Sindical no Brasil na Perspectiva da OIT. O advogado Stanley Gacek, diretor- adjunto do escritório da OIT no Brasil, explicou que essencialmente toda a referência normativa e jurídica da OIT (Organização Internacional do Trabalho) nessa área é oriunda das Convenções 87 e 98.

Segundo ele, a Convenção 87 foi adotada em 1948 e o artigo 2ᵒ diz que os trabalhadores e os empregadores têm o direito de constituir as organizações que estimem convenientes, assim como o de filiar-se a estas organizações, com a única condição de observar os estatutos das mesmas. “O artigo 3ᵒ deixa bem claro no inciso 2ᵒ que as autoridades públicas deverão abster-se de toda intervenção que tenha por objetivo limitar este direito ou entorpecer seu exercício legal”, frisou.

Gacek explica que a Convenção 98 foi adotada em 1949, visando complementar e suplementar a Convenção 87, com três objetivos fundamentais: “Proteção contra atos de discriminação antissindical, a garantia e a promoção da negociação coletiva e proteção contra ingerências nos assuntos internos e na governança interna de organizações dos empregadores e dos trabalhadores de ambos os lados”, disse.

Já o parágrafo 2 da Declaração da OIT de 1998 sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho estipula que todos os Estados Membros da OIT, mesmo sem uma ratificação das oito convenções relevantes, inclusive Convenção 87, têm uma obrigação vinculada ao fato de afiliação à organização. “É o respeito, a promoção e a realização, em boa fé e em conformidade com a Constituição da OIT, dos princípios ligados aos direitos garantidos pelas oito convenções fundamentais”, afirmou.

Ele ressaltou que mesmo sem uma ratificação da Convenção 87, o Brasil tem a obrigação de respeitar a força vinculante das outras convenções ratificadas que têm teor normativo análogo ou quase idêntico ao conteúdo da Convenção 87. “Convenção 141 sobre os direitos de organização sindical dos trabalhadores rurais (ratificado em 1994) e Convenção 151 relativa à proteção de direito e organização e aos processos de fixação das condições de trabalho na função pública (ratificada em 2010)”, esclareceu.

Supervisão

DSC_0479Gacek ressaltou que em geral os peritos têm observado e concluído que o Estado e as autoridades governamentais têm o dever de afastar-se totalmente da administração e do financiamento interno das organizações sindicais. “Supervisão pelas autoridades tem que ser limitada ao recebimento de relatório financeiro anuais. Na opinião do Comitê de Liberdade Sindical, toda a disposição que reserve ao governo um poder ilimitado de proceder à auditória contábil geral dos fundos sindicais é incompatível com o direito de liberdade sindical e as autoridades públicas devem abster-se de qualquer intervenção que possa restringir-se direito ou cercear seu legítimo exercício”, disse.

O diretor da OIT no Brasil afirmou que uma auditoria ou uma verificação apenas seriam permitidas, em conformidade com as normas da OIT sobre liberdade sindical, se houvesse evidências (comprovantes) de que o sindicato estivesse desrespeitando suas próprias regras internas (por exemplo, sua própria constituição). “Ou se houvesse evidências de fraude ou desfalque, e um número significativo dos trabalhadores filiados (por exemplo, 10%) tivesse solicitado investigação ou tivessem preparado uma queixa para as autoridades”, disse.

Gacek enumera exemplos de ingerências contra autonomia administrativa e financeira sindical de parte das autoridades: “estabelecimento da contribuição financeira mínima dos filiados, o poder de supervisão geral das contas sindicais pelas autoridades públicas, o poder das autoridades de regular e limitar os salários e os benefícios máximos dos empregados contratados pelos sindicatos, regulamentação do montante dos fundos repassados às federações sindicais”, descreveu.

Restrições

DSC_0494Também citou a aprovação prévia de algumas operações financeiras, inclusive o recebimento de fundos do Exterior, restrições na liberdade dos sindicatos de investir, gerenciar e utilizar ativos e fundos como eles quiserem, desde que as aplicações sejam para os fins normais e legítimos de atuação sindical, um poder administrativo ilimitado e geral de examinar as contas, os acervos e os arquivos de uma organização sindical a qualquer hora, intervenção e gerenciamento externo na aplicação dos ativos e das contas de um sindicato nos casos de multas e penalidades impostas na organização.

Quanto à questão de cotas, contribuições e arrecadações sindicais obrigatórias, Gacek explica que embora o Caso nᵒ 2739 tratasse o assunto das contribuições assistenciais, também as conclusões e as observações do Comitê têm uma relevância quanto à questão das contribuições obrigatória em geral, chamado os “union security clauses” em inglês. “O Comitê concluiu que quanto à questão de contribuições destinadas à sustentação da estrutura sindical, descontadas dos salários dos trabalhadores, inclusive dos não afiliados, conforme cláusula negociada numa convenção ou acordo coletivo aplicável também aos não afiliados que aproveita dos benefícios da representação sindical, o Comitê havia seguido em casos anteriores o seguinte princípio: caso a legislação permitir a prática do desconto obrigatório de contribuições destinadas à sustentação da atividade sindical, inclusive dos não filiados, a prática tem de ser realizada exclusivamente através da negociação dos acordos e das convenções coletivas”, ressaltou.

“Não são contrários aos princípios de liberdade sindical, desde que a legislação nacional permita a prática dos descontos obrigatórios, e exclusivamente através do processo de negociação coletiva, sem imposição direta pela autoridade do Estado, inclusive a autoridade tributária”, disse.

Porém, Gacek ressalta que dentre as prerrogativas sindicais permitidas pelo artigo 513, alínea “b”, situa-se a competência para “celebrar convenções de trabalho” e, na alínea “e” do mesmo artigo, é atribuição do sindicato impor contribuições a todos àqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas.

O diretor da OIT destaca que nos Estados Unidos a referência jurídica/legislativa principal (National Labor Relations Act – NLRA- é aplicável na maior parte do setor privado e também com algum teor normativo análogo nas legislações relevantes para outros setores, como setor público. “A taxa de sindicalização nos Estados Unidos, hoje, é de menos de 6,7% na área privada e menos de 11,3% na força de trabalho total. A taxa de sindicalização tem tudo a ver com a cobertura da negociação coletiva nos Estados Unidos”, detalhou.

Taxa inteira

DSC_0495 Segundo ele, o que é permitido pela National Labor Relations Act e sua apreciação administrativa/judicial é a negociação no acordo coletivo (conhecido como contrato coletivo entre os norte-americanos) de uma cláusula de “union security” estipulando que dentro de 30 dias após a contratação, o novo empregado terá a obrigação de filiar-se ao sindicato como uma condição de emprego por adiante. O trabalhador (a) teria o direito de não filiar-se, mas também teria a obrigação de pagar a taxa inteira (a contribuição).

O orçamento sindical, explica Gacek, é arrecadado pelas contribuições de “union security” e pode ser aplicado aos fins que o próprio sindicato determina através da sua constituição interna (e não pela legislação nacional ou estadual ou pelas autoridades governamentais), como por exemplo, os custos de negociação coletiva e representação coletiva dos trabalhadores na unidade de negociação, um fundo de greve, organização sindical, e ação política e comunitária. “Também é o sindicato, por meio de sua constituição e regras internas, que determina o nível da contribuição, visto que a legislação e as autoridades não têm absolutamente nenhum papel a respeito, a menos que seja vigilância do cumprimento do sindicato com sua própria regulamentação interna”, frisou.

Gacek ressalta que para pagar apenas a taxa sindical destinada ao custeio da representação dele (por exemplo, os custos de negociação e representação coletiva de um trabalhador individual), o não filiado precisa expressar objeção explícita, e o ajuste será realizado. “Muitos trabalhadores não filiados registram objeções ao pagamento das atividades políticas do sindicato e eles teriam o direito a um desconto proporcional, de acordo com decisão da Corte Suprema dos Estados Unidos”, afirmou.

Entretanto em 24 Estados nos EUA (quase a metade), a legislação estadual proíbe a negociação de uma cláusula de “union security”. Esses estados são chamados de “open shop states” e o sindicato terá obrigação de convencer os novos empregados numa unidade de negociação de filiar-se e voluntariamente pagar a contribuição.

Gacek diz que a legislação sobre o custeio sindical nos Estados Unidos não representa a crise mais profunda para os direitos de liberdade e organização sindical naquele país. “O que é muito mais grave é como a legislação nacional e sua apreciação administrativa/judicial tem fortalecido a ingerência empresarial no processo de sindicalização americana, permitindo avalanche de práticas antissindicais nos Estados Unidos”, frisou.

Organização

DSC_0463Segundo ele fica no ar a seguinte questão: as contribuições financeiras dos empregadores norte-americanos significam necessariamente a interferência e a dominação empresarial das organizações dos trabalhadores? “O artigo 8 (a) (2) da National Labor Relatioans Act proíbe a dominação empresarial de uma organização sindical de trabalhadores, assim como a interferência empresarial nos assuntos internos dos sindicatos dos trabalhadores, e proíbe as contribuições financeiras dos empregadores ou outro apoio a uma organização sindical de trabalhadores”, detalhou.

O artigo 302 da National Labor Relations Act (Emenda Taft-Harley) adiciona sanções criminais contra suborno, propinas e extorsão ilícita a respeito. “O artigo 8 (b) (1) (B) da National Labor Relations Act estipula que qualquer ato de represália, restrição ou coerção de parte de um sindicato de trabalhadores na seleção dos representantes dos empregadores no processo de negociação coletiva seria considerado prática injusta e antissindical (“ unfair labor practice” em inglês), explicou.

O artigo 8 (a) (2) na National Labor Relations Act reconhece as seguintes exceções à proibição total de assistência financeira dos empregadores aos sindicatos dos trabalhadores: a) licença paga para que os trabalhadores (e delegados sindicais) possam tomar conta das queixas e denúncias relativas ao contrato coletivo, b) algumas cortesias pagas pelo empregador relativas às sessões de negociação coletiva (por exemplo, um almoço).

Gacek ressalta que qualquer pagamento ou presente de um empregador para um representante sindical dos trabalhadores em termos de espécie, viagens, um carro, etc., seria proibido. “Tais presentes seriam considerados algo de benefício substantivo para um representante sindical de trabalhadores, e inteiramente proibido segundo o Artio 8 (a) (2)”, frisou.

Contexto

DSC_0455Porém, o artigo 302 da Emenda Taft- Harley (National Labor Relations Act) reconhece as seguintes exceções: A) pagamento regular do salário de um empregado da empresa, que também é representante sindical (artigo 302 (c) (1), b) pagamento de devida compensação e danos morais ao sindicato dos trabalhadores relativos às sentenças jurídicas, decisões de arbitragem, ou TAC´s (settlements, em inglês). (Artigo 302 (c) (2), C) vendas ou compras de imóveis ou outras propriedades, conforme o valor justo do mercado. (Artigo 302 (c) (3), d) remessa das contribuições e cotas descontadas dos salários dos trabalhadores cobertos pelo contrato coletivo (contribuições assistenciais e contribuições associativas) para colocar o conceito no contexto brasileiro. (Artigo 302 (c) (5), e) pagamento aos fundos de pensão, seguro de saúde complementar e outros benefícios aos trabalhadores (chamados “trust funds” em inglês). (Luís Alberto Alves/Comunicação CNTQ)

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